Contradições

Apesar de milhares de “amigos”, cada vez mais solidão, cada vez mais difícil de se encontrar alguém que queira repartir seu tempo e sua atenção para conversar, dividir emoções, pensamentos e sentimentos.

Apesar de muitas postagens e trocas de informações, cada vez menos intimidade para as trocas mais fundamentais, daquilo que é realmente caro, do que importa na vida, os sentimentos e anseios.

Apesar de presenciar tantas histórias de relacionamentos, principalmente nos meios de comunicação, cada vez menos qualidade nos próprios relacionamentos, dominados pela hipocrisia, pelas aparências e pelas expectativas externas.

Apesar de alguns pensamentos profundos, geralmente pensados por outros e compartilhados por quem os achou bonitos, mesmo que não os tenha entendido, cada vez menos autenticidade no pensamento próprio, muitas vezes por já se ter perdido a capacidade de pensar por si mesmo.

Apesar da divulgação de tantas coisas, cada vez menos compreensão da vida, do que a compõe e das consequências dos próprios atos.

Apesar de tanto se falar em liberdade e procurá-la, cada vez mais prisioneiros de conceitos e pensamentos alheios expostos repetidamente sem serem percebidos objetivamente, mas que acabam por determinar a forma de pensar da sociedade onde vivemos.

Apesar de tantas informações instantâneas, cada vez menos conhecimento geral, que se tornou superficial, passageiro e utilitário.

Apesar de tantos esforços para se estabelecer uma conexão com a natureza, cada vez menos qualidade de vida, pois se vive demais em ambientes fechados, longe até mesmo da luz do sol, onde nem é possível perceber se ainda é dia ou se já é noite.

E tudo isso é considerado normal. É no que está se transformando a vida, hoje.

Cada vez mais, o isolamento e a solidão em meio à multidão.

Cada vez mais, o império do egocentrismo e do egoísmo se sobressaindo e tomando o espaço onde poderia se exercer a solidariedade.

Cada vez mais, a vida real, aquela que exige interações entre as pessoas, que não dispensa o olho no olho e as entonações nas conversas para que tudo seja entendido completamente, é menos intensa que a vida virtual.

Cada vez mais, o que parece ser é mais valorizado e procurado do que o que realmente é.

Cada vez mais, a ilusão se apresenta como se fosse a tão buscada solução.

Cada vez mais, o medo em lugar do amor.

Eis a grande contradição e a grande armadilha: tentando se buscar o que parece ser a felicidade, abre-se mão dela, principalmente por causa da tendência de se preferir trilhar os caminhos mais fáceis, ilusórios, evitando os mais longos ou mais árduos apenas por serem mais longos ou mais árduos, embora, muitas vezes, sejam estes os que poderiam levar ao objetivo almejado.